ARTIGO TÉCNICO Adubação: importância do cronograma de execução

André Guarçoni Martins

Doutor em Solos e Nutrição de Plantas na Universidade Federal de Viçosa-MG e pesquisador em Manejo de Culturas no INCAPER


Muito temos discutido em nossos artigos. Abordamos temas até bem teóricos, mas que tiveram boa receptividade, pois foi possível demonstrar sua aplicabilidade prática. Isso nos mostra que os cafeicultores estão buscado alternativas mais econômicas. Entretanto, tenho notado completa despreocupação dos cafeicultores em relação a um fator de grande relevância: o “cronograma de execução de atividades” do programa de correção e adubação.


O cronograma ordena os períodos do ano nos quais devemos executar determinada ação, dentro do programa de correção e adubação. Como veremos, o cronograma de execução é de fácil elaboração e pode proporcionar maior renda líquida, caso seja bem executado. Deve ficar claro que o cronograma trata de períodos, não de dias pré-estabelecidos, uma vez que a agricultura é extremamente dependente das variações climáticas regionais.


Primeiramente vamos explicitar as ações a serem desenvolvidas em um programa de correção e adubação.


a) Coleta e análise de solo – O tempo gasto é variável de acordo com o laboratório; em épocas de pico pode levar mais de um mês para se obter o resultado – a época mais adequada para coleta de amostras de solo é final de abril a meados de maio – mas o tempo de duração estimado é de 4 semanas.


b) Recomendação de corretivos e fertilizantes – Esta etapa é realizada por profissional especializado; não é comum que demore muito tempo, mas isso irá depender de outros fatores. Tempo de duração estimado = 2 semanas.


c) Compra de corretivos e fertilizantes – Esta etapa pode demandar tempo, uma vez que uma pesquisa de mercado é fundamental. Tempo de duração estimado = 2 semanas.


d) Aplicação de corretivos – calcário – A aplicação em si não demanda muito tempo, mas o calcário deve reagir no solo durante um período de, no mínimo, um mês, desde que ocorram chuvas, antes de se aplicarem os fertilizantes – sua aplicação deve ser realizada o mais cedo possível, para que não ocorram perdas. Tempo de duração estimado = 4 semanas (após o início das chuvas).


e) Aplicação de fertilizante fosfatado – Aplicado de uma só vez, um mês após a aplicação de calcário. Tempo de duração estimado = irrelevante.


f) Parcelamentos de fertilizantes contendo N e K – Devem começar um mês após a aplicação de calcário, nunca antes, pois sua eficiência será reduzida. Para o café, geralmente são realizados no mínimo três: na florada, na época do chumbinho e na época do enchimento de grão. Obviamente, se não houver irrigação na área, e não chover no período, o parcelamento deve se aproximar o máximo possível dessas fases fenológicas. Tempo de duração estimado = 14 semanas.


Caso o cronograma de execução atrase em qualquer das etapas, fica claro que a etapa posterior será comprometida, e o programa de correção e adubação irá se transformar em algo sem fundamento, com ações realizadas fora de sintonia com a realidade. Por exemplo: ano passado um cafeicultor me procurou, em novembro, com resultado de análise de solo em mãos, para que recomendasse calagem e adubação para sua lavoura. Obviamente tive que recusar o trabalho, pois, por mais que eu me esforçasse para fazer uma boa recomendação, todo o programa estaria comprometido, e os resultados propostos não seriam alcançados.


Supondo que eu gastasse uma semana para realizar a recomendação, o produtor levasse uma semana para adquirir o corretivo e que este demorasse quatro semanas para reagir com o solo, a primeira aplicação de P, N e K seria realizada em meados ou final de janeiro. Todos nós sabemos que isso seria um descalabro. Se anteciparmos a aplicação de P, N e K, em relação à aplicação de calcário, também estaríamos cometendo um equívoco.


Para que fique claro o acontecido, vamos seguir um raciocínio lógico que irá ajudar a melhor entender o processo:


1) Não existe recomendação de adubação sem análise de solo


Se a quantidade de fertilizante a ser aplicada é igual à quantidade de nutriente requerida pela cultura menos a quantidade de nutriente fornecida pelo solo versus o fator relativo ao aproveitamento do fertilizante, então não podemos recomendar determinada quantidade sem saber quanto o solo fornece: isso é básico.


2) Não existe compra de corretivos e fertilizantes sem a recomendação


Ora, como comprar determinadas quantidades de corretivos e fertilizantes sem saber se serão necessários, ou não, e em quais quantidades? O “achismo” não pode fazer parte da cafeicultura empresarial.


3) Não existe aplicação de fertilizantes sem que transcorra um mês após a aplicação de calcário


Se não transcorreram 30 dias, no mínimo, após a aplicação de calcário, e esta for necessária, de que adianta aplicar fertilizantes, se não houve tempo hábil para a reação do calcário com o solo? Se não esperarmos os 30 dias, terá sido este um recurso mal utilizado e aproveitado.



Como as fases fenológicas do café irão variar de acordo com a altitude e a temperatura da região, cada produtor deve preparar seu próprio cronograma de execução de atividades. Sugiro, apenas, que a coleta e análise das amostras de solo sejam realizadas, no máximo, em meados de maio. Assim, haverá segurança e tranqüilidade para a realização de todas as ações a serem executadas de acordo com o cronograma.


Alguns dirão que estou sendo muito detalhista, e que na “prática” as coisas não funcionam assim. Respondo dizendo que tenho visto alguns retornos econômicos muito interessantes, sem a aplicação de tecnologias extremamente avançadas, bastando, para isso, que os cafeicultores utilizem tecnologias baratas e eficientes, como o simples e fácil cronograma de execução de atividades.


Infelizmente, alguém deve ter elaborado a recomendação para o cafeicultor que me consultou, mesmo antes de tentar conscientizá-lo da importância de se seguir um cronograma de execução. Afinal, dinheiro é dinheiro, certo?


 

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