Novaiorquinos apostam no adubo orgânico

Por: 14/04/2009 18:04:20 - Revista Envolverde

 

14/04/2009 18:04:20 – Revista Envolverde
Por Laura Silver, da IPS



Nova York, 14/04/2009 – Todos os sábados os habitantes do bairro novaiorquino do Brooklyn vão ao mercado de verduras do parque de Fort Greene, mas, não apenas para comprar. Levam sacolas de plástico e baldes cheios de casca de vegetais, sacos de chá usados e produtos com validade vencida. Tudo pelo composto, ou adubo orgânico. “Guardo na geladeira, em um saco plástico, por uma semana, e depois levo ao mercado. Ajuda a diminuir meu lixo”, disse o morador Jake Robbins. O esforço coletivo permite coletar 365 quilos de sobras de alimentos por semana. Os jardineiros locais os transformam em seguida em “ouro negro”: o composto serve para melhorar cultivos urbanos e ajuda a reduzir o lixo sólido municipal, que acabam se decompondo nos lixões.


Não se paga pelas cascas de laranja ou coroas de cenouras. Mas existe um senso de ajudar a apoiar o ecossistema local. “Acredito na elaboração do composto”, disse Arnold Smith, que em um sábado se desfez de um balde de couve de Bruxelas vencidas, bem como de grãos de milho e frutos impróprios para o consumo. “Somos uma família de quatro pessoas e comemos muito”, contou. Além disso, tem um quintal de cimento, o que tornaria difícil elaborar ali o composto.


Aos sábados no mercado de Fort Greene os voluntários instalam seis latas diante dos postos de venda de maças, cebolas, mel e sidra. O cartaz apoiado nas latas de lixo não exibe preço: colocar ali os dejetos orgânicos não tem custo. Mas se incentiva os participantes a retirar sacos das latas e substituí-los por novos durante o dia. O Conselho sobre Meio Ambiente de Nova York patrocina 45 mercados de rua de verduras dentro dos cinco distritos da cidade, mas este é o único ponto de venda que permite deixar ali os dejetos para composto. “São coisas úmidas, pesadas, sujas. Não é para qualquer um”, disse Roy Arezzo, do Carlton Bears Garden em Fort Greene.


Ao adubar o solo, o composto captura os metais pesados impedindo que contaminem os recursos hídricos ou sejam absorvidos pelas plantas. Também reduz as emissões de metano, um forte gás de efeito estufa. Comumente, para os que deixam as sobras de alimentos ou para que as recolhem, reduzir o que vai para a corrente do lixo é uma recompensa em si mesmo. E também é uma oportunidade de devolver algo à comunidade, embora não da maneira tradicional. “É preciso estar um pouco louco para transportar composto”, admitiu Alice Hartley, outra integrante do núcleo que em outubro de 2006 ajudou a assentar as bases para o sistema de transporte do composto.


Agora, no transcurso de um mês, quase uma dezena de pessoas se revezam para transportar os restos de comida em um triciclo industrial construído expressamente para essa finalidade. Trata-se de um aparelho de velocidade única, com freios de pé e uma plataforma semelhante a uma jaula colocada na parte dianteira, desenhada para transportar 10 sacos cheios de dejeto alimentar. A cada semana, são feitas três ou quatro viagens desde o mercado até um dos quatro jardins participantes a uma distância de 1,6 quilômetro, equivalente a 15 minutos.


Charlie Bayrer, que faz trabalhos de manutenção na vizinhança, é um autodidata guru do composto, que elabora há 11 anos em Hollenback Garden. Ele calcula que as sobras de alimentos deixadas nas latas do mercado representam metade da matéria-prima que gerada pelos 15 metros cúbicos de composto terminado que seu jardim produz por ano. Depois que os dejetos de alimentos sem tratamento chegam ao jardim, tem início outro processo coletivo. Colaboradores ajudam a integrar as sacolas de sobras em cinco montes de composto que geram temperaturas de 71 graus e que às vezes são usados para aquecer recipientes de sidra.


Bayrer está feliz pela forragem para seus tórridos montes de composto, mas não se importaria se alguém que passasse por ali fizesse mais do que deixar as casas das frutas. “Seria lindo se fossem mais curiosos sobre o que acontece depois”, disse durante uma viagem no “verduriciclo” que seguiu um trecho da rota da maratona da cidade de Nova York. Em geral, o sistema continua funcionando com um grupo pequeno mas dedicado. “Nesse ponto é um acordo de manutenção muito baixa”, contou Hartley, encarregado de comunicações de uma empresa de arquitetura e que, como Bayrer, se especializou na elaboração de composto nos jardins botânicos do Brooklyn.


“Alguém simplesmente sobe no triciclo e sai dirigindo”, disse, Bayrer, acrescentando que o grupo não perdeu um único fim de semana desde que o projeto começou, há três anos. Nem a chuva, nem a neve e nem as temperaturas de 32 graus os impedem de fazer as viagens. Aos 161 anos, o parque de Fort Greene, de 12 hectares, está salpicado por lixos para coletar metal, mas não há recipientes destinados ao lixo orgânico. “Fort Greene não quer resíduo alimentar em seu parque”, disse Arezzo, professor de ciências que há cinco anos começou um projeto para elaborar composto na escola secundária onde trabalhava. O Departamento de Parques “tem muito medo do dejeto alimentar’, afirmou.


Phillip Abramson, porta-voz do Departamento, evitou a questão dos alimentos, mas insistiu que as pilhas de composto “ajudam a cidade ao desviarem os resíduos orgânicos da corrente de dejetos”. E embora esse órgão não tenha um controle direto sobre a maioria dos jardins comunitários na cidade, há cooperação, especialmente para ajudar a impulsionar a imagem ecológica desse departamento. “Estimam que dois terços de nossos 500 jardins comunitários têm algum nível de elaboração de composto”, afirmou Abramson por correio eletrônico.


O Departamento de Parques de Nova York elabora composto a partir de galhos de árvores, lascas e pedaços de arbustos da cidade. O Departamento de Saneamento oferece vários dias “de devolução”, quando os jardineiros urbanos podem viajar às áreas periféricas para recolher composto feito de resíduos do parque. Mas isso não envolve sobras de alimentos. Coletar cascas e borra de café continua sendo um esforço da sociedade civil. Hartley, que ajudou a implementar o sistema do “verduriciclo”, espera que chegue o dia em que os esforços de seu grupo motivem outras pessoas a criar projetos locais de sustentabilidade. “Mantemos algumas conversas com as pessoas do mercado verde sobre replicar este modelo. Esperamos que este programa ganhe uma dimensão maior”, acrescentou.


O diretor do mercado verde de Nova York, Michael Hurwitz, concorda. E afirma que o caminho para a elaboração do composto é um método excelente de manejo sustentável de lixo em pequena escala. “Gostaria que estivesse sendo gerado em cada um de nossos mercados”, disse. Isso envolveria identificar grupos e organizações locais dispostas a fazer o trabalho sujo. Por sua vez, Hurwitz cita um exemplo de sua vida pessoal. Ele vive perto do mercado do parque de Fort Greene e usa o adubo orgânico     deixado semanalmente ali. E, muito frequentemente, os restos de suas verduras terminam ainda mais próximo de sua casa: em seu jardim. “Às vezes, acabo de comer uma cenoura e simplesmente jogo sua coroa no solo”, contou.


* Este artigo é parte de uma série produzida pela IPS (Inter Press Service) e pela IFEJ (Federação Internacional de Jornalistas Ambientais) para a Aliança de Comunicadores para o Desenvolvimento Sustentável (www.complusalliance.org).


 


(Envolverde/IPS)

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