Starbucks tenta se reinventar para crescer novamente

24 de janeiro de 2010 | Sem comentários Cafeteria Consumo

Domingo, 24 de janeiro de 2010, 7h00 

Empresas

Starbucks tenta se reinventar para crescer novamente


Claire Cain Miller


Jovens usando blusas com capuz e óculos de aros grossos estão bebendo cervejas de pequenas marcas locais ou cafés expressos, enquanto comem queijo e baguetes de uma padaria próxima e ouvem um cantor que se acompanha ao violão.


O cenário poderia ser qualquer café independente dos Estados Unidos, mas em lugar disso é a 15th Avenue Coffee & Tea, uma loja da rede Starbucks.


A nova unidade, uma das duas instaladas no elegante bairro do Capitólio, em Seattle, surgiu de uma série de discussões de um grupo de funcionários da Starbucks, instruídos pelo presidente-executivo da empresa, Howard Schultz, a “quebrar as regras e fazer as coisas por conta própria”.


A diretiva era parte de seu esforço, desde que retornou ao comando do grupo, dois anos atrás, de recuperar a companhia em crise, injetando na cadeia multinacional de cafés uma dose da agilidade, da pressa e da aceitação de riscos inerentes a uma companhia iniciante.


“Nós perdemos o rumo”, ele disse. Para reencontrá-lo, “temos de voltar a pensar como iniciantes, combatendo nas trincheiras a cada dia. E com o tipo de discussão e de atenção que provavelmente deixamos de ter, como empresa, desde aqueles primeiros dias – o medo de fracassar, a avidez de vencer”.


Existem indicações de que os esforços de recuperação da Starbucks estão dando resultado. Na quarta-feira, a empresa reportou que em seu primeiro trimestre fiscal, que incluiu a importante temporada de festas, a receita líquida foi de US$ 241,5 milhões, ante US$ 64,3 milhões no período comparável um ano antes.


O faturamento subiu em 4%, para US$ 2,7 bilhões. As vendas das lojas já existentes subiram em 4%, revertendo uma sucessão de declínios. No ano passado, as ações da empresa quase triplicaram de valor, atingindo os US$ 23,29, mesmo que essa cotação ainda esteja significativamente abaixo do recorde de quase US$ 40 atingido em 2006.


Mas mesmo que Schultz, que adquiriu as primeiras seis unidades da Starbucks em 1987, ainda veja a empresa com olhos de um empreendedor iniciante, ela já não é novata, e suas lojas não são cafés de bairro. Alguns analistas imaginam se a Starbucks está enfrentando dificuldades para aceitar sua nova identidade.


“Será difícil recapturar a espécie de ressonância que eles tiveram em dado momento”, disse Bryant Simon, professor de História na Universidade Temple e autor de um livro sobre a Starbucks. “O sentimento dele sobre a marca está se sobrepondo àquilo que é realmente factível agora”.


Quando Schultz retornou, em janeiro de 2008, a empresa havia acabado de registrar o primeiro declínio trimestral de sua história no número de transações registrado em suas lojas dos Estados Unidos. Enquanto a rede abria 2.571 novas lojas em 2007, um número recorde, suas ações enfrentavam queda de 42%.


Logo em seguida, os gastos dos consumidores começaram a cair e a Starbucks, que vende supérfluos e não necessidades, foi uma das primeiras empresas a sentir o aperto. Enquanto isso, surgia um novo concorrente, quando a rede McDonald’s começou a vender café expresso.


Ao falar sobre a Starbucks, Schultz, acomodado em uma das novas lojas da rede em Seattle e experimentando um expresso com leite integral, emprega frases como “a autenticidade da experiência do café” e “o romantismo, o teatro, de trazer aquilo à vida”.


Mas as frases não representam a realidade encontrada por muitos fregueses da rede, que passam correndo pelo café a cada manhã antes de começar a trabalhar, ou por muitos dos ex-fregueses, que prefeririam rejeitar a uniformidade das lojas Starbucks em troca de pequenos cafés locais que servem um produto preparado com mais cuidado.


A primeira tarefa de Schultz ao retornar foi pôr fim à abertura em larga escala de novas lojas, demitir 1,5 mil funcionários nos Estados Unidos e 1,7 mil no restante do mundo e descobrir como levar os 150 mil trabalhadores restantes a um espírito de empresa pequena, cujo interesse dominante é servir o melhor café possível.


Os compradores de café da Starbucks, por exemplo, costumavam escolher apenas variedades de café produzidas em escala suficiente para atender a todas as unidades da rede. Rejeitavam café produzido em pequenos lotes, a especialidade dos cafés artesanais. Schultz inverteu essa política. “Não queremos que todas as nossas lojas sejam iguais”.


Mas ao mesmo tempo em que tenta retomar parte do espírito de uma empresa iniciante, Schultz cedeu a algumas tendências características das grandes empresas, que rejeitava anteriormente. No ano passado, a Starbucks começou a realizar pesquisas entre seus clientes, e promoveu sua primeira campanha publicitária nacional.


Os empreendedores, mais que os executivos tradicionais, “tentam sempre movimentar as coisas, chutar o pau da barraca, porque gostam do caos e da confusão da reinvenção, e Howard tem certa dose desse espírito”, disse Warren Bennis, fundador do Instituto de Liderança da Universidade do Sul da Califórnia, que conhece Schultz desde os anos 90.


Mas ele também percebeu que o empresário desenvolveu “um lado mais ponderado, mais profundo”. Bennis acrescentou que “não creio que ele venha a ser um desses empreendedores clássicos, capazes de inventar mas não de gerir”.


Schultz trouxe Cliff Burrows, que estava administrando as lojas internacionais, de volta a Seattle, como responsável pelas operações nos Estados Unidos. Uma das primeiras descobertas que fez ao conversar com os clientes parecia básica, mas passou despercebida em meio ao esforço da Starbucks para abrir novas lojas.


Os fregueses no sul do país preferem bebidas frias, enquanto os do nordeste preferem café convencional e os do noroeste e da costa do Pacífico optam pelo expresso. Mas os executivos encarregados das diversas regiões da empresa no país haviam dividido as áreas por fuso horário, e não estavam considerando as necessidades dos diferentes clientes.


Burrows alterou a demarcação das regiões geográficas. “Subitamente, você percebe que não se trata apenas de estatísticas, mas de clientes cujo comportamento está relacionado ao local em que vivem”, disse.


Schultz também recontratou Arthur Rubinfeld, que havia deixado a empresa em 2002, como presidente mundial de desenvolvimento, encarregado da seleção de locais e projeto de lojas. Para evitar a uniformidade excessiva, Rubinfeld está dando a cada nova loja um toque de “localidade”, ele diz, para refletir o bairro e sua história arquitetônica.


Na loja do University Village, em Seattle, por exemplo, há uma longa mesa comunitária feita com o tronco de um freixo que caiu depois de um temporal no bairro de Walingford; a mesa oferece múltiplas tomadas elétricas, porque sua freguesia noturna é formada por estudantes com seus laptops.


Nas lojas da Starbucks no bairro do Capitólio, as mesas são enfeitadas por flores silvestres exibidas em vasos diferentes, comprados em antiquários locais. Os grãos são moídos de acordo com as instruções dos clientes, e despejados por um cone semelhante aos usados nos cafés artesanais. No pátio, os grãos usados são deixados em um balde, com um cartaz que estimula os vizinhos a levá-los para uso na compostagem, em seus jardins.


Um dos clientes, Joshua Covell, que vive em San Francisco e está na cidade de visita, disse que jamais havia ido a um café Starbucks. “Todos os Starbucks têm a mesma cara”, afirmou. “Não é natural gostar dessas corporações gigantes, mas é perceptível que eles estão tentando”.


Mas Sylvia Lee, uma médica que vive no bairro, disse que estava entusiasmada com a nova loja – até descobrir que era uma Starbucks. “Ninguém quer ser o consumidor enganado e reconquistado”, disse.


Para a empresa, as novas lojas servem em parte como laboratórios. Algumas das coisas que vendem, como os cafés de pequenas torrefadoras e os expressos feitos de acordo com as instruções dos clientes, serão adotados em outras unidades.


Mas elas também servem para que Schultz satisfaça seu espírito empreendedor. Ele diz que planeja unidades semelhantes em outras cidades, com obras de artistas locais e equipadas com mobília local recuperada. “Creio que seremos capazes de fazê-lo de modo semelhante, e a menor custo”. As informações são do The New York Times / Invertia.

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